quarta-feira, 1 de outubro de 2008

A última lição aos mouros

Admito que assumir uma visão carrancuda sobre o futuro do futebol azul e branco possa parecer um exercício complacente. Principalmente quando ocorre poucos minutos depois de o FC Porto ter sofrido uma humilhação no Emirates Stadium, aos pés do jovem Arsenal. Mas em apoio à honestidade do que iriei escrever, o facto de poder apresentar testemunhas que, se necessário, comprovarão o timing em que as minhas previsões foram anunciadas. Isto é: na pré-época.

Se retirar a honrosa excepção Octávio Machado, observar a performance de Jesualdo Ferreira, enquanto treinador portista, é o evento que mais me cativa nos últimos anos da realidade azul e branca. Podemos analisar um pouco do percurso do professor para tentar compreender porquê.


Crítica em tempo de homenagem

Tenho de admitir que, sem recorrer a qualquer arquivo de jornal, a minha memória não alcança ponto mais distante, no tempo, do que a estada do professor nas equipas técnicas das camadas jovens nacionais e, mais tarde, como principal responsável dos sub-21. É impossível questionar a qualidade do trabalho efectuado por Jesualdo Ferreira, ao serviço da FPF. Ainda hoje o futebol português vive frutos desse trabalho. Mas, mesmo na homenagem, podemos ser críticos.

Foi no tempo de Jesualdo Ferreira, seleccionador dos sub-21 portugueses, que se tornou obrigatória a táctica do 4x3x3. Infinitas vezes usada nos AA, mas que, na minha opinião, não deveria ser táctica obrigatória por aí a baixo. O discurso era: se os AA usam, e usam porque de facto (ainda) não temos avançados para praticar outro sistema, as selecções jovens devem exercitar a mesma disposição táctica, por forma a facilitar a implementação dos ditos automatismos em futuros jogadores da Selecção A. Errado!

Expliquem-me lá porque se insiste em manter um sistema, quando sabemos que este foi escolhido por exclusão de partes e não por ser o modelo a seguir? Não faria mais sentido trabalhar com o objectivo de formar mais avançados, pontas-de-lança genuínos, colocando em campo sistemas tácticos que promovam a presença de dois avançados-centro? Como o 4x4x2 ou o 3x5x2?

No fundo, o que estamos a incentivar é que se torne apenas necessário fabricar um avançado de qualidade por geração. E a castigar os nossos médios, obrigando-os a jogar, quase sempre, em inferioridade numérica. A crítica, diga-se de passagem, é também dirigida aos técnicos da era pós-Jesualdo, incluíndo os actuais. Estes, tiveram muito tempo para erradicar esta tacanhez táctica nas nossas selecções.


O fenómeno Zahovic

Nos anos seguintes à saída das selecções nacionais, surge nova época dourada na carreira do professor Jesualdo Ferreira. A passagem pelo Alverca. Bons resultados, bom futebol, o fenómeno Mantorras e o salto para o Benfica.

Benfica... O teste de fogo que deixou as asas de Jesualdo bem chamuscadas. Maus resultados, mau futebol, uma curta estada e o fenómeno Zahovic. Não fruto do factor futebolístico, mas sim de declarações proferidas pelo médio, avançado no tempo de Camacho e Trapatoni. O esloveno comentou, em modos gerais, e a propósito da chegada do sucessor de Jesualdo (Camacho), que o Benfica passava a ter um treinador a sério, que os treinos não eram mais uma palhaçada. E nem se consegue suavizar as declarações, partindo do princípio de que o treinador em causa é um exemplo a seguir...

Depois disto, destas declarações, pensei: o mister está arrumado! Só que... Pinto da Costa, previsível na sua perversão, interiorizou que o professor seria o instrumento ideal para infligir mais uma lição aos mouros. E aqui vai disto! Consegui-o. Durante um ano. No entanto, duvido que se repita.


O exemplo Fucile

Durante a época 2007/2008, cheguei a uma conclusão simplista, que transpus para a corrente época desportiva: O FC Porto não tem futebol! Tem uma defesa sólida, um meio-campo certinho, e alguns jogadores de categoria que safam alguns jogos. Porque bom futebol, futebol moderno e envolvimento colectivo, não vimos... Não vemos!

Na presente época, hoje, depois de levar um banho de futebol do Arsenal, o Porto é a expressão máxima das suas características negativas. Uma equipa sem alegria no jogo, previsível nas rotinas ofensivas, onde os desinspirados avançados não decidem. Observe-se, ainda, a agravante de o plantel ter sido privado de jogadores nucleares, na generalidade, mal substituídos. A defesa já não é tão sólida assim. Entraram dois laterais moles, para os lugares de Bosingwa e do castigado Fucile.

Castigado, sim, porque depois de ter assistido ao penalty à Panenka, que o uruguaio ousou transformar em golo na pré-época e a consequente expressão de raiva do professor, acompanhada de um punho cerrado na direcção do lateral, ninguém me convence de que este não está de castigo. Pelo menos até Jesualdo Ferreira chegar finalmente à conclusão de que este é o melhor lateral do plantel.
E convém não esquecer que, ironia das ironias, Fucile foi, por diversas vezes a época passada, ele próprio instrumento de castigo para o atrevido Bonsingwa.

Portanto, em conclusão, depois de tanto reflectir, a lição aos mouros vai ser curta, desta vez. O professor não tem mãos para o Ferrari e, ainda por cima, detectam-se alguns bugs nas mudanças automáticas.

Faltam Bonsingwa, Fucile, Paulo Assunção e Quaresma (este último, único bem substituído, entre novas contratações e jogadores que transitaram da época anterior). No entanto, existem Bruno Alves, Lucho, Meireles, Rodriguez, Lisandro e uma série de jogadores competentes... Não será exigível ver este Porto jogar melhor futebol? Diria que sim.