quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

A lenda de Mou

No dia 16 de Fevereiro de 2009, José Mourinho será distinguido com o título Honoris Causa, atribuído pela Faculdade de Motricidade Humana. Mais uma honraria no caminho deste treinador que encanta o Mundo e contribui sobremaneira para inflar o orgulho nacional. Os ingleses apelidaram-no the Special One; os italianos chamam-lhe Mou; para os portugueses é Mourinho, José Mourinho: homem que arrisca tornar-se lenda maior que Eusébio.

A fama do português cruza gerações e zonas geográficas. A sua postura faz mossa em todos: fomenta profunda admiração ou acicata ódios. A sua personalidade frontal e propícia a controvérsia é o que o distingue dos outros treinadores que conquistam títulos prestigiantes mas não nos oferecem... emoções.


O presente

No início da época 2007/2008, o Special One abandonou o comando técnico do Chelsea. O despedimento (se assim se pode chamar) suscitou um (genial) comentário de Carlo Ancelotti. O então e actual treinador do AC Milan, comparou Mourinho a «uma mina que qualquer um se arrisca a pisar»... Roberto Mancini foi quem acabou amputado.

A contratação do mister português pelo Inter é, por si só, mais um contributo para a lenda... José Mourinho foi substituir um treinador tricampeão italiano. Como suplantar tal feito?... Mancini queria manter-se no cargo e a maioria dos tiffosi era favorável à sua continuidade. Mesmo perante este cenário, Massimo Moratti – homem de grande visão e coragem – decidiu arriscar e avançar para a contratação do português. De seguida, o presidente interista pediu três desejos a Mou: continuar a vencer campeonatos; ganhar a Champions; que o técnico permaneça igual a si próprio. O desejo que enumero por último é tudo menos trivial... Um futebol que apenas foi notícia nos últimos anos devido ao escândalo Calciocaos e nas vitórias do AC Milan na Liga dos Campeões necessita, urgentemente, de novos motivos de interesse. Mou não desiludiu! De início, na vertente comunicador polémico. Passados poucos meses, também na vertente treinador de futebol.

José Mourinho foi o centro das atenções no momento em que aterrou em Milão. Cada conferência de imprensa que dá, opinando sobre a partida mais banal à mais escaldante, torna-se um momento televisivo de utilidade pública. Se existisse um talk-show, tipo compilação dos encontros do português com a imprensa internacional, eu estaria sempre colado à TV. O discurso sem papas na língua; a forma como soube aprender a ser autocrítico; o facto de, sem embaraço, destacar individualmente os seus jogadores, para o bem e para o mal; a capacidade de, em simultâneo, demonstrar respeito e desafiar os seus adversários continua a fascinar meio mundo. E a outra metade não consegue ficar indiferente.

No futebol, o Inter pode fazer melhor e está obrigado a mostrar mais. No entanto, todos os objectivos se mantêm intocáveis e a liderança da Série A aparenta ser firme. Mou foi testando sistemas, foi testando jogadores e foi sendo criticado por não se ver, de imediato, um grande Inter, mas lá vai levando a água ao seu moinho e as críticas vão-se transformando em elogios.

Como é hábito suceder a jogadores orientados pelo técnico português, espera-se que algumas figuras deste Inter dêem o salto de grandes jogadores para jogadores de elite. Ibrahimovic já estava à porta, Mourinho parece decidido a empurrá-lo lá para dentro. Maicon deverá ser considerado unanimemente o melhor lateral direito do Mundo, lá para o final da época. Muitos jogadores são demasiados velhos para que o milagreiro lusitano possa intervir decisivamente nas suas carreiras. Mesmo assim, a imprensa italiana não se cansa de destacar o ressurgimento de Stankovic. Alguns jovens e outros futebolistas talentosos, ainda com margem de progressão, andam às turras com José Mourinho. Nada de novo. Normalmente beneficiam os que acabam por baixar as orelhas perante o mister.

Em Itália, não só em Milão, espera-se muito do nosso Mourinho. Por estranho que possa parecer, este vai, progressivamente, assumindo-se como o salvador do calcio. O futebol italiano tem sido vítima do desinteresse generalizado, perdendo claramente protagonismo para os campeonatos inglês e espanhol. Os próprios tiffosi não preenchem os estádios. Mas o português redefiniu os tempos de visibilidade do calcio na comunicação social global, ele próprio faz questão de passar essa mensagem dentro do país – ouçam o que eu digo, façam o que eu mando e o futebol italiano vai voltar a ter o protagonismo dos anos 80 – os opinion makers parecem estar a reagir nesse sentido. José Mourinho é, de facto, um indivíduo fascinante. E peço-vos perdão porque não consigo esconder o meu próprio fascínio.


O futuro

Que futuro para José Mourinho? Para já, dois terços de época no Inter. Depois, provavelmente mais uma ou duas temporadas a orientar os milaneses. E depois? Depois... Há poucos clubes – não posso dizer do Mundo – da Europa que aspiram a contar com os serviços do técnico português. Arriscaria uma dúzia. Mais tarde, seguramente com muitos mais títulos no seu currículo especial, chegará a vez da Selecção. Ele já manifestou esse desejo, mais lá para o fim da carreira, a pré-reforma. Porque ser seleccionador é uma quase morte: acaba a rotina diária e passa-se o tempo a colocar cruzinhas no calendário à espera do próximo estágio. De qualquer forma, não vai faltar muito. O técnico já manifestou a vontade de se reformar cedo, sendo assim, a pré-reforma (Selecção) não andará longe.

Mas a (minha) curiosidade não termina aqui. O que fará José quando decidir reformar-se de treinador de futebol? Ele já respondeu que estará o mais longe possível do desporto-rei. Mas não o imagino dedicado exclusivamente à família e aos amigos. Quem viu entrevistas sobre o seu dia-a-dia reconhece, sem dificuldade, os sintomas evidentes de um trabalhador compulsivo... Seja qual for o seu futuro, por certo que discreto não será.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Individualidades desequilibram

A palavra individualidades é, no desporto rei, sinónimo de craques: indivíduos que perturbam o equilíbrio entre os adversários numa partida de futebol; os jogadores que resolvem. Mas esta última jornada europeia teve o condão de introduzir, para os portugueses, um novo sinónimo de individualidades no dicionário do futebolês: indivíduos que perturbam o equilíbrio entre os adversários numa partida de futebol; os jogadores que enterram.

Os jogos de Sporting e Benfica, frente a Barcelona e Olympiakos respectivamente, são, hoje em dia, uma raridade que deve ser extinta com a maior urgência. Fico com a clara noção de que jogos destes só acontecem aos clubes portugueses. São o nosso fado. Jogos em que um, dois ou três atletas têm falhas catastróficas ao nível da concentração, tremem como varas verdes, falta-lhes confiança e parecem perdidos em campo. Será, provavelmente, um problema do foro psicológico que urge ser diagnosticado e erradicado rapidamente.


Ora enterras tu, ora enterro eu

O Sporting recebeu o Barcelona para mais uma jornada da Liga dos Campeões. O resultado final foi 2-5. Desfecho que se poderia encarar como normal tendo em consideração os resultados que o Barcelona tem conseguido esta época, a nível interno e na Champions. No entanto, focando a atenção exclusivamente nos golos, fica a ideia de que os leões foram responsáveis pelos sete ocorridos na partida. Que o Barcelona pouco ou nenhum mérito teve na obtenção dos seus cinco tentos.

Para começar, Carriço: verdadeiramente infantil a forma como se deixa bater por Messi antes do argentino assistir Henry para um golo fácil. Incompreensível, também, a forma como Miguel Veloso não faz o mínimo esforço para acompanhar a entrada na área do francês. O segundo golo é, acima de tudo, um golpe de sorte para os catalães, apesar da desorientação geral da defesa leonina. O terceiro tento é patético! Polga mete a mão à bola e ficam quatro jogadores leoninos estáticos a olhar para o árbitro (comportamento típico no nosso futebol) enquanto Daniel Alves marca rapidamente o livre para Messi inserir a bola nas redes. O quarto e o quinto golos são fruto de intervenções, no mínimo, atabalhoadas de Caneira, Grimi e Rui Patrício. É mesmo caso para se dizer... Ora enterras tu, ora enterro eu.


David vira Golias kamikaze

Já no jogo do Benfica em Atenas, frente ao Olympiakos, David Luiz assumiu-se como o grande protagonista da calamidade (derrota por 5-1). O jovem central brasileiro regressava ao onze encarnado, por força do impedimento de Luisão, depois de longa ausência. Oportunidade de ouro para mostrar que estava preparado para ocupar, no futuro próximo, uma das duas posições centrais na defesa titular benfiquista. Oportunidade falhada! Fica no ar a dúvida se a coisa não teria corrido melhor com o outro puto (Miguel Vítor) a titular. De qualquer forma, fazia sentido colocar David Luiz de início. Afinal, todos conhecemos a sua categoria e era importante dar minutos ao brasileiro. A sua exibição é que não fez qualquer sentido.

Diga-se, em abono da verdade, que Jorge Ribeiro e Sidnei deram uma boa contribuição para facilitar a goleada dos gregos, começando aos 45 segundos e terminando aos 53 minutos. Mas o desnorte de David Luiz era tal que fico com a sensação de que os outros dois se foram malfadando por arrasto. Nunca antes vi um jogador profissional tão perdido em campo, sem saber que terrenos pisar e de que forma intervir nos lances. Como foi possível tal desacerto? Nem consigo começar a elaborar uma explicação. O comportamento do jovem central em campo seria uma óptima fonte de inspiração para um episódio de uma série tipo Twilight Zone. Resta saber como vai reagir...


Rui Santos

Reflecti muito sobre se havia de escrever as linhas que se vão seguir. Não tenho qualquer desejo em criar inimigos com estes artigos de opinião, mas não consigo resistir a fazer uma critica directa a um comentador de futebol da SIC Notícias, Rui Santos.

Quando instado a comentar o jogo entre Benfica e Olympiakos, o ex-chefe de redacção do jornal A BOLA começou por referir que Quique Flores estava obrigado a dar explicações à nação benfiquista sobre a razão da não utilização de Katsouranis. Entre as várias hipóteses que lançou para justificar a ausência do grego da equipa titular não se lembrou da questão física. Só uma pessoa desatenta às notícias diárias é que não sabia que Katsouranis se viu recentemente afectado por uma virose e apenas efectuou um treino antes da partida para a Grécia. E eu a julgar que o trabalho de um comentador passava por estar atento precisamente a estes pormenores...

Mas não se ficou por aqui. De seguida, exigiu explicações a Rui Costa e Filipe Vieira. Porquê? Porque o Benfica contratou grandes nomes que ganham fortunas mas que jogam pouco e estão de rastos fisicamente. Não digo que ele não tenha razão, mas que raio tem isto a ver com a calamidade de Atenas? Todos conseguem perceber que o problema esteve na defesa (tal como na partida de Alvalade) e não propriamente nos craques do meio campo para a frente, independentemente de terem jogado bem ou mal. Continuou, então, a criticar a política de contratações. O foco, desta vez, era a ausência de um médio criativo. Nem vou comentar se o Benfica tem ou não um médio criativo, mas mais uma vez, que diferença teria feito um médio criativo no jogo com o Olympiakos? Absolutamente nenhuma. Pelo meio, lá conseguiu dispensar trinta segundos para aludir à juventude da dupla de centrais benfiquista. Como eu gostaria de ter ouvido os seus comentários à derrota do Sporting...

O essencial a reter é que este ilustre comentador deslocou-se aos estúdios da SIC não com o objectivo de fazer uma análise do Olympiakos-Benfica, mas sim com outro intuito qualquer. Não faço ideia qual, mas de certeza que Rui Santos tem uma missão a cumprir que não envolve fazer o trabalho para o qual foi contratado. Será que ele viu o jogo ou é ceguinho? Se resposta residir na segunda hipótese, então garanto-vos que neste ceguinho dá vontade de bater.

* 28/11/2008

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Cresce e aparece, Ronaldo!

Cristiano Ronaldo, expoente máximo do futebol português da actualidade. Fenómeno madeirense que os portugueses tanto admiram e elogiam. Eu não fujo à regra, ou antes, não fugia. Ultimamente, a minha admiração foi, progressivamente, convertendo-se em antipatia e pena. Sim, pena. Pena de ver um indivíduo que tinha condições de ser um exemplo para a juventude transformar-se num homemzinho que apenas vive para alimentar o seu ego. Pena de constatar que o maior ícone do futebol português não passa de um catraio mimado e irresponsável. Pena de observar que nada está a ser feito para contrariar esta tendência.

A época 2007/2008 viu explodir um novo Ronaldo (havia outro, o brasileiro) no panorama mundial. Mais de quarenta golos marcados numa só temporada. Exibições e golos memoráveis em dezenas de jogos. Títulos individuais e colectivos. Uma época em que foi, sem dúvida, o melhor do Mundo. Mas, pelos vistos, as suas performances em campo não chegaram para o satisfazer. Aparentemente, existe a necessidade de maior exposição. E como se promove ainda maior exposição depois de um ano de tanta visibilidade? Criando e alimentando polémicas. Mostrando ingratidão por quem nos tornou no que somos. Criando ódios dentro da nossa própria casa. Dando respostas parvas e provocadoras em entrevistas. Enfim, é este o Cristiano Ronaldo versão 2008/2009.

Raramente consigo concordar com as ideias de Miguel Sousa Tavares mas, no seu último artigo de opinião em A BOLA, este escreve um comentário sobre Cristiano Ronaldo que me vejo forçado a transcrever: (...) «Cristiano Ronaldo. O homem que já virou griffe e que se faz tratar por CR7, perdeu-se no jogo [frente ao Brasil] apenas por culpa do vedetismo e vaidade que vem dando mostras, em crescente descontrolo. Quando lhe perguntaram se era o melhor jogador do mundo e ele respondeu que era «o primeiro, o segundo e o terceiro», quando lhe perguntaram se era mais bonito que Kaká e ele respondeu «gosto de mim», quando foi substituído no sábado, em Inglaterra, depois de mais um exibição completamente apagada, e saiu com o dedo espetado a indicar que era o n.º 1, já dá para perceber que aquele rapaz precisa urgentemente de quem lhe explique coisas básicas sobre a vida e a maneira de estar no futebol, como em tudo o resto...». Tenho pena de que Sousa Tavares se tenha antecipado (ou que eu demore tanto tempo a escrever o que me vai na alma), porque algumas destas palavras são precisamente as que gostaria de ter escrito.


Os gatilhos

De facto, o rapaz já irrita. A constante necessidade de mostrar serviço em prejuízo da equipa e a sua tendência para se tornar o centro das atenções apenas incutem antipatia em quem o vê pavonear-se por esses estádios fora. Além da ausência de humildade e de uma grande dose de vaidade, há que diagnosticar, ainda, um caso evidente e bem agudo de egocentrismo. Aliás, por muito que me custe revelar esta dica a potenciais adversários da Selecção, há uma forma muito simples de parar Ronaldo. Não é com um, dois ou três defesas, mas sim com elogios. A treinadores e jogadores adversários basta dizer, alto e bom som, que ele é o maior, que «só se consegue pará-lo com uma pistola», e comentários do género. Vão ver que ele entra em campo com o ego de tal maneira inchado que mais ninguém vai ter bola nesse jogo. É tudo dele. E quem se lixa? A equipa onde ele joga e o treinador que não tiver a coragem de o mandar para o banco. Jogos contra Albânia e Brasil são dois excelentes exemplos disso mesmo.

É, de qualquer forma, curioso verificar que este é um fenómeno relativamente recente. CR7 nunca foi um exemplo de humildade, mas os comportamentos que tanto desaprovo só começaram a surgir no defeso. Se me permitirem a ousadia, aponto dois gatilhos que espoletaram esta alteração comportamental. O primeiro é a cada vez mais popular constatação de que Cristiano Ronaldo não rende nos jogos decisivos. Não vale a pena procurar exemplos para contrariar esta crença, porque eles não existem. As dúvidas lançadas sobre o seu rendimento, nos momentos importantes, levaram o jogador português a criar um mecanismo de defesa que o incita a procurar, constantemente, formas de estimular o seu ego. O segundo gatilho é a eleição do melhor jogador do ano, que se tornou uma obsessão do madeirense. E uma obsessão raramente é saudável.


Recados

Hoje em dia, quando vejo um miúdo na rua a jogar à bola e o ouço dizer que quer ser o Cristiano Ronaldo, fico logo nervoso. A minha vontade é dizer-lhe: «não queiras ser o Ronaldo rapaz». Este é o meu recado para os miúdos por este país fora: se gostam de futebol, se querem ser craques, procurem outros jogadores na moda para vos inspirarem. O futebol não se resume a fazer muitas e variadas fintas e impressionar as miúdas.


Quase me esquecia... Por tudo o que é sagrado, prof. Queiroz e sr. Madaíl, tirem a braçadeira de capitão a este menino e coloquem-na no braço de um homem que saiba respeitar os adeptos portugueses e que possua os outros atributos indispensáveis a um capitão de equipa. Atributos esses que, por muito que os procurem, jamais encontrarão em Cristiano Ronaldo.

* 26/11/2008

Regularidade a quanto obrigas

É comum ouvir dizer que os campeões ganham mesmo quando jogam mal. Outro lugar-comum é dizer que o campeonato é uma prova de regularidade. Está a tornar-se um lugar-comum dizer que o Benfica é o mais forte candidato ao título, que tem o melhor plantel. Arrisca-se também a tornar-se um lugar-comum a pergunta: o que se passa, Benfica?

No Benfica versão 2008/2009 nota-se, de facto, uma mudança... para melhor. A atribuição de competências no cargo de director desportivo, ocupado por Rui Costa, veio conferir coerência ao processo de aquisições, incluindo a do treinador. O plantel é equilibrado e há soluções para responder a diferentes desafios. Os adeptos aderem aos jogos em número e com entusiasmo. Há, no plantel, jogadores de classe mundial que resolvem partidas e estimulam os sonhos dos sócios.

Porém, de vez em quando, ficamos todos (sócios, simpatizantes e meros espectadores) estupefactos com algumas exibições dos encarnados. Basta lembrar as partidas com o Rio Ave, Leixões e Naval, estes para a Liga, e Penafiel para a Taça de Portugal, para ficarmos com muitas dúvidas se este Benfica tem estofo de campeão. Em contraponto, podemos recordar as (belas) exibições contra o Sporting (Liga) e Nápoles (Taça UEFA), e ficamos deveras confusos sobre o real valor dos encarnados.


As flores para Quique

O novo Benfica iniciou-se com a procura de um treinador. Depois de falados e apalavrados alguns nomes conhecidos de todos, a escolha final recaiu em Quique Flores. Apesar de não ser uma figura de topo no universo dos treinadores de elite, não pode ser considerado um desconhecido por quem está minimamente atento ao que se passa pelo mundo futebolístico.

Pouco importa, agora, discutir o percurso do treinador espanhol... o que ganhou e o que não conseguiu ganhar. Importa, sim, referir que o discurso do ex-técnico do Valência é uma lufada de ar fresco no futebol português. A sua filosofia de futebol positivo é um chamariz para levar adeptos aos estádios. É, de facto, um treinador que se distingue da mesquinhez que, por vezes, marca discursos e comportamentos dos técnicos nacionais.

Em início de época, a missão de Quique Flores encontrava-se bem definida. Avaliar o plantel, livrar-se da fruta estragada e ajudar Rui Costa a escolher fruta da época, capaz de abrilhantar as fruteiras dos jantares mais jet set. Numa análise simplista, diria que a missão foi cumprida. Passava-se, então, à construção de uma equipa e à construção de um futebol. Os tais mecanismos, automatismos e demais ismos que todos conhecemos, tinham que chegar rapidamente, porque o Benfica estava obrigado a entrar forte na época desportiva. Em anos anteriores, as primeiras jornadas serviram, na maioria dos casos, para confirmar que a equipa da Luz continuava sem estilo de campeão. Seria a época 2008/2009 diferente?


Lugares-comuns

A pré-época termina em grande. Os jogos com Inter e Feyenoord revelam uma equipa com mais futebol que o que seria previsível, quando consideramos um plantel renovado e com um novo treinador. Mérito para Quique. A equipa mostrava-se madura e o trabalho ao nível das manobras ofensivas era bem visível. Seria de esperar que o primeiro jogo oficial da época fosse a confirmação de um Benfica convincente e vencedor. Puro engano! Viu-se uma equipa sem futebol, sem pressionar, sem atitude. Definitivamente, um passo atrás.

Seguem-se jogos medíocres alternados com jogos de grande qualidade. Regra geral, nos jogos medíocres, o que se nota é uma falta de atitude confrangedora, diria mesmo, uma bandalheira. Jogadores sem pressionar a bola e o adversário, à espera que os golos apareçam como que por milagre. Quique desespera e não é o único. É aflitivo assistir à forma displicente como alguns jogadores encararam determinadas partidas e os adversários.

O discurso dos responsáveis encarnados é cuidadoso e inteligente. A equipa está em crescimento, em busca da regularidade. Todos acreditamos e aceitamos este discurso. O problema reside no facto de este não servir para justificar o mais evidente: Os jogadores não se apresentam com a mesma atitude em todos os jogos. A culpa será do treinador, que não consegue motivar os jogadores? Duvido. Diria antes que a culpa é dos lugares-comuns... Os jogadores convenceram-se de que os nomes vencem jogos; de que, mesmo sem jogar bem, sem correr, se conseguem ganhar jogos contra equipas menores; de que um campeão ganha... mesmo sem jogar bem. Este último até pode ser verdadeiro, mas há algo que um campeão nunca dispensa: atitude! Sem garra, sem vontade e sem sacrifício não há campeões. Depois destes atributos garantidos, então sim, podemos afirmar que um campeão também vence nos maus dias. Porque, pelo menos, a vontade existe.


O verdadeiro campeão

Se me permitem um paralelismo com o boxe, o verdadeiro campeão entra no ringue para arrumar com o adversário no primeiro assalto. Não fica pachorrentamente à espera do último assalto, convencido de que o oponente vai acabar por tropeçar, bater com a cabeça na campainha e perder o combate por KO. O futebol é em tudo idêntico. Frente a equipas teoricamente inferiores, há que entrar em campo com atitude guerreira. Mostrar quem manda é imperativo. Citando uma dupla de comentadores de outra modalidade – "dão vida aos mortos e depois aturem-nos". Esta frase reflecte perfeitamente o que sucede quando alguns clubes ditos grandes, defrontam os ditos pequenos. E o Benfica tem sido o espelho disso mesmo. Apenas algumas individualidades e a sorte, têm evitado que os estragos sejam maiores.

Urge mudar atitudes. A regularidade que a equipa técnica pretende atingir passa, acima de tudo, por convencer os jogadores a encararem todas as partidas com uma mentalidade de conquista. Se esse objectivo for atingido, a regularidade, nas exibições e nos resultados, será uma realidade. Porque, clubismos à parte, este Benfica tem os melhores jogadores, já tem a melhor equipa, e tem o melhor treinador da nossa Liga. Parece-me evidente. Mas não chega.


Hoje, à passagem da nona jornada da Liga Sagres, o clube da Luz é segundo classificado, um ponto atrás do (insira aqui o adjectivo) Leixões. Segue à frente de Porto e Sporting, uma novidade por si só. Nesta altura, por força da posição na tabela classificativa e, também, da qualidade do seu plantel, os encarnados perfilam-se como o grande candidato ao título. Sobra identificar qual o seu principal adversário: FC Porto? Sporting? Leixões? Na minha opinião, o próprio Benfica.

* 24/11/2008

Rumo ao Estrelato

O tópico de hoje continua a ser futebol... mas gerado por pixeis. Falo, obviamente, de um videojogo. O PES 2009, mais concretamente um modo de jogo, intitulado Rumo ao Estrelato.

Na sua essência, PES 2009 é apenas mais um jogo de futebol, cujo objectivo é marcar golos, fantasiar um pouco e divertir-nos, sozinhos ou com alguns amigos. No entanto, este título da japonesa Konami apresenta algo de especial... Rumo ao Estrelato proporciona uma nova experiência no mundo dos jogos de desporto, algo que eu, enquanto aficionado, aguardava há muito tempo.

Nos videojogos de futebol de acção (também existem os de estratégia), o jogador controla todos os futebolistas da sua equipa. Defende, ataca, passa a bola entre os seus bonecos, finta, marca golos, etc. Neste novo modo de jogo, o utilizador controla apenas um futebolista: o seu representante virtual na elite do futebol mundial.


O eu virtual

O grande objectivo do Rumo ao Estrelato é proporcionar ao futebolista de ocasião (alguns nem isso) uma aproximação à experiência de vestir a pele de um futebolista de elite. Obviamente, é obrigatório encetar um exercício de imersão para se vibrar com os sucessos de um futebolista gerado por pixeis, mas garanto-vos que não é difícil.

O primeiro passo, ao entrar neste modo de jogo, é criar o nosso eu virtual. E a imersão inicia-se aqui. Damos o nosso nome ao boneco, atribuímos-lhe as nossas características físicas, perguntamos à família se está parecido connosco, fazemos os ajustes finais, escolhemos a posição em campo e gravamos. Começamos, então, a jogar à bola.

Passamos por várias etapas até atingirmos um nível que nos permita jogar com a elite, processo demorado e por vezes frustrante. Mas o que fica na retina é a forma como reagimos às situações normais da vida de um futebolista. Ficamos lixados quando o treinador nos deixa no banco, ficamos fulos quando uma perda de bola nossa resulta em golo do adversário e deliramos quando marcamos um golo. No final de cada partida, é com ansiedade que consultamos a nota que foi atribuída ao nosso desempenho (ao estilo dos jornais desportivos).


Saber estar em campo

No entanto, existe algo mais... a nossa postura em campo. A nossa cultura e a disciplina táctica têm reflexos na evolução dos nossos atributos. Passear à toa pelo campo é penalizado. Saber estar em campo e ocupar os espaços que nos estão destinados são predicados que irão proporcionar uma evolução mais rápida das nossas capacidades.

Pode parecer exagero atribuir ênfase ao comportamento táctico de um boneco num jogo de futebol virtual, mas há vários exemplos onde os mundos virtuais são aplicados como forma de treino para várias situações bem reais. Neste sentido, Rumo ao Estrelato assume, de facto, um carácter de simulação e um veículo de aprendizagem. No nosso eu virtual, vemos reflectidas as nossas características da vida real. Vemos reflectida a maneira como lemos e interpretamos o futebol.

Não é utopia pensar nos mundos virtuais como meios de preparação para o mundo real. Ou até mesmo como substitutos de experiências que não chegamos a viver. Quando entramos no PES 2009, em modo Rumo ao Estrelato, podemos comprovar isso mesmo. Publicidade à parte, que ninguém me paga para isso, afirmo com convicção que estamos perante o início de um novo universo de experiências em entretenimento virtual, cada vez mais reais.


* 15/11/2009

Da teoria à prática

É difícil encontrar forma de justificar o empate da nossa Selecção diante da Albânia. Mais fácil é justificar a derrota frente à Dinamarca, até porque a exibição foi boa. No caso da Albânia, no entanto, quase tudo foi mau... quando se passou da teoria à prática.

Importa atribuir culpas, pois claro! Mas, acima de tudo, o que pretendo é analisar o trabalho do actual seleccionador nacional, até ao jogo com a Albânia, e retirar conclusões sobre a sua competência para ocupar esse cargo.

Não vou entrar em análises curriculares, nem enfatizar o percurso de Carlos Queiroz. Interessa o presente e, obviamente, o futuro próximo. Isto porque, neste momento, a qualificação para o Mundial está em risco. Claro que também não vou fazer paralelismos com o anterior seleccionador.

Tenho de admitir que fui a favor da nomeação de Queiroz para treinar as quinas. Sei que a maioria dos entendidos foi do contra, mas eu não sou da maioria e, provavelmente para muitos, nem sou entendido. Estava convencido de que, depois da experiência em Manchester, o professor teria a prática necessária para lidar com os nossos craques. A teoria, essa todos sabemos que a tinha.


Montar a equipa

Portugal tem quatro jogos disputados nesta fase de qualificação. Uma vitória frente a Malta (grande jogo), uma derrota frente à Dinamarca (grande jogo, resultado injusto) e dois empates consecutivos: Suécia (resultado e exibição aceitáveis) e Albânia (o escândalo).

Nessas quatro partidas, o esquema táctico da Selecção foi sempre o 4x3x3. Seria de esperar algo diferente? Eu gostaria... talvez um dia. É aceitável que não se mude? Vejo-me forçado a admitir que sim. A escassez de pontas-de-lança de qualidade mantém-se e, afinal, foi com esta disposição que conseguimos bons resultados nas últimas grandes competições. Portanto, em relação ao esquema táctico, não podemos ser excessivamente críticos, por muito que me apetecesse.

Outro ponto a analisar é a formação inicial para cada partida.
Em relação ao guarda-redes, nada há a comentar. Na defesa, apenas a eterna questão do lateral-esquerdo. Neste caso, até podemos afirmar que Queiroz tentou. Tentou promover um lateral-esquerdo de raiz, tentou que este se enquadrasse na Selecção e que viesse a dar garantias. Alguns particulares e dois jogos a sério serviram para comprovar que ainda não foi desta. Adapte-se Paulo Ferreira ou Caneira, porque lateral-esquerdo ainda não existe. A experiência Antunes falhou.

No meio-campo, impunha-se encontrar substituto para Petit (não cheguei a ouvir este dizer que se retirava da Selecção, apenas o ouvi fazer um comentário hipotético no início do Euro-2008). Mas, passando à frente, Miguel Veloso seria o substituto na calha. Só que o rapaz insiste em portar-se mal e não joga no Sporting, logo, não joga nos AA. Sobra Raul Meireles, que se tem afirmado um jogador seguro e responsável. Os outros dois centrocampistas são, em condições normais, Deco e Maniche (que falta fizeram nos últimos dois jogos). Por ausência destes, foi preciso improvisar frente a Suécia e Albânia. Contra os altos e loiros, jogaram Meira (opção válida, na teoria) e Moutinho (opção natural). Frente aos toscos, jogaram Moutinho, de novo, e Manuel Fernandes, este último, opção arriscada mas compreensível, se bem que Carlos Martins talvez fosse a opção mais ofensiva. De qualquer forma e, mais uma vez na teoria, as opções iniciais foram aceitáveis e, em alguns casos, até louváveis. Houve quem gritasse por Danny no meio-campo... Caros amigos, desculpem, mas o moço é avançado, não é médio, ainda menos num meio-campo formado apenas por três jogadores.

No ataque... joga Cristiano Ronaldo. Em forma ou longe dela, simpático ou mal-educado, a marcar ou a falhar... joga sempre. Não sou eu quem vai dizer o contrário, embora uma substituição de vez em quando só lhe fizesse bem, e o jogo com a Albânia teria sido uma boa oportunidade para demonstrar isso mesmo. Simão também joga sempre, ou devia, e que falta fez ele, como se pode comprovar pelos muitos golos que tem marcado em Espanha. Depois... depois, o ponta-de-lança. A opção tem sido Hugo Almeida. Tal como no caso de Antunes, trata-se de uma experiência, um pouco mais bem sucedida que a do lateral. Hugo Almeida é um avançado raro no futebol português, percebe-se a intenção de tentar fazer dele o homem-golo que tanto falta a Portugal. Na teoria, só me parece bem... falta o seleccionador aprimorar os timings para o ter em campo, sozinho ou acompanhado.

Como vemos, na teoria, Carlos Queiroz faz quase tudo bem... até entrar em campo. Pensa bem a equipa, sabe que atletas tem ao seu dispor e em quem deve apostar (mais uma vez, partindo do princípio de que o sistema táctico é intocável). Na prática... bom, já todos vimos o que acontece na prática. É razoável e até acertivo referir que as substituições são tardias e, por vezes, simplesmente mal feitas. É inegável que os nossos jogadores não apresentaram, frente à Albânia, índices motivacionais aceitáveis em jogadores de alta competição. Ambos os casos já foram devidamente estudados e comentados por muitos. Permanece, no entanto, a dúvida sobre quem recai a maior dose de responsabilidade quando os jogadores não demonstram a atitude que deles se espera.


Eu acredito!

Importa, então, saber se chegamos ou não ao Mundial. Eu acredito que sim. Temos mais e melhores jogadores que os nossos directos adversários. Acredito, também, que os nossos atletas não vão querer ficar de fora de tão épica competição. Se a motivação existir, e os nossos principais jogadores estiverem aptos, pelo menos o segundo lugar do grupo (e consequente play-off) deverá ser nosso.

Depois, vem a fase final. Aí, não tenho dúvidas de que o professor Queiroz estará nas suas sete quintas. Com semanas para trabalhar os jogadores, em vez de dias, terá tempo para tirar partido das suas virtudes e disfarçar as suas deficiências. Só resta garantir que lá chegamos.

No entanto, se a coisa correr mal e for necessário encontrar novo seleccionador, eu avanço já com um nome: Zico! Curiosamente, foi o primeiro nome sugerido para substituir Scolari. Quando se fala em perfil para seleccionador nacional, dificilmente encontro perfil mais indicado que o do grande campeão brasileiro. E alguém se lembra do futebol praticado pelo Fenerbaçhe na época passada? Eu lembro... Era bem bonito.

* 16/10/2008