domingo, 18 de janeiro de 2009

Esquecer Cruyff

No dia 17 de Janeiro de 2009, o Barcelona goleou o Deportivo da Corunha por expressivos 5-0 e alcançou novo recorde de pontos somados numa primeira volta do campeonato espanhol, desde que este se disputa com 20 equipas e com a vitória a valer 3 pontos. Decorridas 19 jornadas, os catalães marcaram 59 golos (média de 3.1 por partida) e sofreram apenas 13. Números impressionantes que atestam a qualidade do trabalho de um treinador que muitos condenaram ao fracasso, entre os quais eu me incluo.

No início da época, consegui entender o porquê de Laporta contratar Guardiola mas de imediato vaticinei um retumbante fracasso do projecto Barcelona 2008/2009. O jovem técnico tinha pouca ou nenhuma experiência a treinar jogadores de elite, a sua postura denotava pacatez e até alguma passividade, que me levou a prever que o treinador espanhol não teria pulso para orientar equipas de topo. A seu favor, tinha o facto de ser um homem da casa e ter atingido uma dimensão enquanto futebolista apenas ao alcance de uns poucos. Como jogador, o ex-médio era, essencialmente, um atleta muito inteligente e possuidor de impecável cultura táctica, atributos que vemos reflectidos no actual futebol do Barcelona.

Os primeiros jogos da temporada pareciam confirmar as suspeitas de muitos. O Barcelona ganhou pouco e jogou mal. No entanto, essa fraca produção não durou muito e, paulatinamente, começou a surgir uma equipa cada vez mais demolidora. Depois de uma pequena limpeza de balneário e sem ter o plantel mais rico do planeta, longe disso, o Barça parece ter as pedras certas nos sítios certos. Um grande central, Puyol, dois médios muito inteligentes e de enorme capacidade técnica, Xavi e Iniesta, o melhor jogador do momento, Messi e um goleador, Eto’o. Não posso deixar de referir Thierry Henry, que atravessa uma fase bastante produtiva, ele que alguns meses atrás parecia terminado para o futebol.

O Barcelona também evidencia algo que muitas equipas carecem, os tais mecanismos de que tanto se fala. É uma equipa com um fio de jogo perfeitamente estabelecido, coerente com a tradição filosófica do clube, que assenta em posse de bola prolongada, alternada com grande rapidez de execução no último terço do campo e sempre em busca do golo. Fica a ideia de que, com mais ou menos craques, a equipa sabe sempre o que fazer e como chegar à baliza do adversário. É, na essência, o Barcelona de tradição holandesa, cujo representante máximo era o futebol praticado pelas equipas orientadas por Cruyff. Digo era porque, mantendo estes números no que resta da época, a grande referência do futebol espectáculo e eficiente passará a ser o Barcelona de Guardiola, com a vantagem de ostentar uma solidez defensiva nunca antes vista por terras de Gaudí.

O futebol é uma caixinha de surpresas, o próprio desempenho do Barcelona começou por ser uma surpresa mas, se não ocorrer uma grande surpresa, Pepe Guardiola está destinado a render Johan Cruyff no trono da memória colectiva blaugrana... Disso, tenho a certeza.

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